Era setembro, tinha tido Dia do Brasil no sábado anterior. Resolvi comprar passagens para o Carnaval sem nem saber se teria dinheiro para continuar morando em Buenos Aires até fevereiro, porque planejar mais que um ou dois meses à frente, na atual fase da minha vida, anda impossível. Em janeiro resolvi alterar a data da passagem para ficar 11 dias em São Paulo, depois de 11 meses sem dar as caras na cidade que eu nasci e vivi a vida toda.
Chegou o tão esperado 6 de fevereiro. Um dia lindo em que acordei antes de amanhecer, me arrumei, peguei a mala, peguei o ônibus e enfim pisava no Aeroparque. Depois de umas dez vezes indo lá buscar e levar amigos, me emocionar com encontros e despedidas, chegava a minha vez de voar rumo à minha cidade.
O voo atrasou. Quando o avião acelerou na pista, meu coração também foi a 1.000 por hora. Olhei pela janela, vi a linda Buenos Aires ficando pra trás, lembrei porque gosto tanto desta cidade. Na tentativa de controlar a ansiedade, peguei a revistinha de entretenimento da companhia aérea. Para a minha surpresa, trazia a programação dos blocos de Carnaval em várias cidades, inclusive São Paulo. O melhor disso? eu estaria lá. Minutos deppois surge guaraná no serviço de bordo. Gente, eu nem era de tomar muito guaraná, mas quando vi ali e tomei, parecia a melhor coisa do mundo.
Horas depois, e com mais um pouco de atraso pelo tráfego aéreo de Guarulhos, pousei. Reencontrei minha família. Eu não via meu pai e meu irmão desde julho. Minha mãe, então, desde maio. Parecia um sonho. Logo depois veio a estranheza: ouvir e ler tudo em português, andar pelo bairro onde morei 23 anos e ver tanta coisa diferente. Esta sensação de estranheza me acompanhou nos dias seguintes, quando usei ônibus, metrô. E começaram a acontecer coisas do tipo: me perdi no terminal de ônibus que usei tantas vezes porque mudaram os pontos das linhas. Outro dia, cheguei no ponto da linha que sempre pegava. Um senhor me questionou se o ônibus passava na avenida tal. “Desculpe, não sei, não moro aqui”, foi a minha resposta, que ficou ecoando por minutos na minha cabeça. De fato, São Paulo já me parecia meio estranha porque não é mais a cidade que eu moro.
E sobre isso, soa coxinhice e é difícil de explicar. Óbvio que em umas semanas eu voltaria a me sentir em casa como se nunca tivesse havido Buenos Aires. Mas São Paulo não é mais a cidade que moro pra eu me sentir 100% à vontade. Visitar minha cidade natal foi… DIFERENTE. Esta é a palavra! E esse é o motivo do desconforto: achei que 11 meses não seriam suficientes pra achar nada diferente. E é engraçado: me senti indo da minha casa para a casa ao mesmo tempo em que me sinti sem pátria, por não me sentir 100% daí nem 100% daqui. E nunca serei.
Nos dias no Brasil eu voltei a comer a comida da minha mãe, vi familiares, vi amigos e cantei e dancei em blocos e mais blocos. Porque uma coisa não muda, caros amigos: a paixão pelo Carnaval (lembro que falei pros meus amigos que, acontecesse o que tivesse que acontecer, mas em 2015 eu estaria no Carnaval paulistano). Voltei a dormir na cama que sempre dormir, a estar numa zona de conforto de pensar apenas em trabalhar (porque não peguei folga) e me divertir, sem pensar em contas, em burocracias para resolver, em problemas de adulto. Foi um descanso mental necessário.
Voltei para Buenos Aires com o coração na mão de saber que toda aquela gente querida não estaria mais presente no meu dia-a-dia, mas já com saudades das terras portenhas. E voltei com a mesma sensação que sempre tive, desde que comecei a querer vir viver aqui: que, na verdade, eu queria estar 50% em São Paulo e 50% em Buenos Aires. Como o teletransporte ainda não existe, espero que as companhias aéreas baixem preços e permitam que essa distância se faça menor.